segunda-feira, 11 de agosto de 2025

PATRIMONIO HISTÓRICO E IMPROBIDADE

 

Na noite de 10/08/25, a causa dos ruídos de musica alta no entorno da minha casa, chamei várias vezes o número de emergência 190  e so tocava música, ninguém respondia.  Depois de uma hora de tentativas, a meia noite resolvi mandar um zap para o oficial do dia da BPM e para a NEAC... dizendo que há horas o 190 só tocava  música...e eles ficaram de tomar providencias. Fui dormir.

Esta manhã nos veio uma dúvida atroz: e se tivessem bloqueado o meu número? Provei por mais de uma hora, será que estava fora do gancho, mas eu ouvia musica... Reconheço que  telefono muitas vezes, tarde da noite, quando os ruídos superam os decibeis estabelecidos pelo CONAMA. É um meu direito e esse numero, o 190, foi criado para preservar, também, a tranquilidade da população. 

Na duvida, vamos tentar esclarecer que não se trata de implicância, mas de direitos, que bem poucos conhecem, e portanto, nem defendem.

Estamos cansados de nos perguntar: que motivações levam os prepostos de instituições públicas a autorizar eventos em flagrante desobediência ao arcabouço legal vigente, ao bom senso e à moralidade. Quem fazia barulho se encontra do lado de uma igreja histórica e o Código de Postura determina uma distância de 200 metros, de tais prédios. Isto serve também para quem circula por praças tombadas fazendo ruido desde de manhã cedo. Os 200 metros de distancia, é previsto para as 24 horas.

Não raramente, ainda ocorre a vergonhosa omissão, para evitar dizer cumplicidade, de instituições também públicas, que deveriam fiscalizar o cumprimento das leis, e propor a punição dos infratores, no âmbito judicial. Em vez, a responsabilização por prática de ato de improbidade administrativa é uma coisa rara. Nada vemos acontecer  para combater a ações lesivas ao patrimônio cultural brasileiro, seja ele público ou privado e que inclui a poluição sonora.

 Seria ignorância do arcabouço jurídico, leviandade, despreparo técnico e/ou moral para o exercício do cargo, ou outros fatores pouco nobres? Seja qual for a motivação nada justifica tantas aberrações decisórias, e abusos na transgressão de normativos legais. Parece que não existem funcionarios formados em Direito para evitar tais comportamentos.

Será que todos os funcionários públicos e os políticos sabem que, ... “os bens integrantes do patrimônio cultural brasileiro, também chamado meio ambiente cultural, estão submetidos a um especial regime de proteção jurídica e a sua gestão é sempre subordinada a ações de controle e fiscalização por parte de órgãos públicos, nos três níveis da Federação.”

Além do mais,  os "atos de improbidade administrativa que causam lesão ao erário, eles podem compreender qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades públicas,..." Mas o patrimônio particular, e a saúde do cidadão, lesados em continuação, ninguém comenta nem se preocupa.


Quem deve fiscalizar o respeito das normas em vigor?  Em âmbito federal, por exemplo, ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) toca promover a salvaguarda e a conservação do patrimônio cultural acautelado pela União, a exemplo dos bens tombados, sítios arqueológicos, patrimônio ferroviário, entre outros. Em vez ao Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM) incumbe a tutela dos bens musealizados. A PM e a GM também tem competências a respeito da defesa do nosso patrimônio histórico, e um dos numeros de acesso é o 190.  Será que não acreditam que a poluição sonora, além de disturbar os cidadãos,  provoca trepidação nas construções?

Em 2022 já tínhamos enfrentado esse problema, e voltamos hoje preocupados com a possibilidade de soluções mais absurdas para não fazerem o próprio dever, por menor que seja. Será que são formados em Direito esses funcionários que ignoram as normas...ou são apenas arquitetos?

Notamos que muita gente desconhece as leis deste nosso estado democrático, portanto ACONSELHAMOS A LEITURA DESTE ARTIGO POR INTEIRO quem sabe melhora um pouco os resultados da gestão da área tombada.

https://www.conjur.com.br/2020-mai-23/ambiente-juridico-improbidade-administrativa-gestao-patrimonio-cultural


sábado, 2 de agosto de 2025

SÉCULO XXI - AMAZÔNIA NA ITÁLIA

O que faziam os brasileiros exilados ou não pela Europa, a partir dos anos 70? Isso é algo que poucos sabem. 

No meu caso, depois de lutar contra a ditadura, ajudando a derruba-la, comecei a escrever sobre a Amazonia. Ocasionalmente em algumas revistas,  mas no ano 2000, comecei a colaborar com a revista Mundo Brasil. Me ocupava da Amazonia, de vários pontos de vista. Ela era feita por brasileiros e era distribuida inclusive na Embaixada e nos poucos consulados que ainda tinham por lá.

Aqui temos alguns artigos publicados em 2002/2003, 






Agosto de 2002 - PATRIMÔNIO IGNORADO , escrito em italiano.


                                          Março 2003- Obras de Landi



                           Abril 2003 Ajuricaba heroi da Amazonia
 Agosto 2003 Remanescente de quilombos


2002/2003 em italiano/portugues


Antes de voltar definitivamente para Belém em 2004 ainda deu tempo de colocar uma placa na casa do Landi com a ajuda da Região Emilia Romanha .




Ao voltar colaborei com a revista PARÁ+ que ao me presentear com uma imagem da N. Sra. de Nazaré, favoreceu a organização de um CIRIO em Bolonha, antes que eu voltasse definitivamente para Belém.

2024 mudando o manto da N. Sra de Nazaré, que se encontra na basilica de S. Bartolomeu e S Giacomo, em Bolonha,  com o  Monsenhor Stefano  Ottani, que nos ajudou a organizar o Cirio e a paraense Rose que carregou o andor da santa  durante a procissão, vinte anos atrás.
2011 revista Pará+mostra fotografica de Celso Abreu




E continuamos e
m Belém na luta... ingloria, de defesa da nossa memória histórica.



quinta-feira, 31 de julho de 2025

O QUE DEVE CONTER O PLANO DIRETOR?

 

Para começar, somos da opinião que esse PD deva ter um capitulo totalmente dedicado a área tombada. Que seja esclarecido o que as leis em vigor não dizem de modo explicito, por exemplo a impossibilidade de usar cores diferentes nas casas/prédios daquelas que a nossa memória recorda em tal área. Que a gentrificação também não é prevista em tal área , mas tem gente já se mexendo para conseguir fazer isso... Não é o caso de tomar providências, ou os arquitetos estão de acordo  a modificar nossa memória histórica a tal ponto, vista a liberdade que vemos  eles terem ao interpretar as leis? Quem sabe, alguem formado em Direito, interpretaria melhor...

A preservação dos bens de valor histórico, cultural, arquitetônico, ambiental e afetivo para a população, não impede o respeito do que já existia no momento do tombamento de determinadas áreas. Seria o caso de impedir que sejam destruídos ou descaracterizado aqueles prédios não tombados singularmente, mas que já fazem parte, historicamente de tal área. De fato, o tombamento, é um ato do Poder Público, que também visa proteger esses bens, restringindo modificações e garantindo sua conservação para as futuras gerações, incluindo sua cor original...mas, é o caso de lembrar também que a intenção não é tentar mandar os moradores originais para outros bairros.

Notamos o estrago feito nas calçadas de liós, tombadas pela SECULT, que criam problemas para os pedestres ao serem usadas para  dar entrada a garagens em prédios antigos, ou a presença de postes que ocupam praticamente quase toda a calçada, obrigando o pedestre a usar o meio da rua.

Notamos que cada vez que asfaltam o leito das ruas, aumentam de alguns centimetros a sua altura, relativamente as calçadas. De tanto aumentar a altura do asfalto, a água da chuva acaba entrando nas lojas adjacentes... Os proprietários dessas lojas acabam cobrindo as pedras de liós com cimento para evitar alagamentos... Esse o motivo de encontrarmos na Dr. Assis, por exemplo, vários degraus, longitudinais que impedem a acessibilidade, ou seja,  uso de cadeiras de rodas ou de bebês, no bairro.

Quem mora na Cidade Velha e que por algum motivo usa esses pequenos meios de transporte (cadeira de rodas ou carrinho de bebê), sabe o quanto é difícil, aliás, impossível usar as calçadas nessa área tombada e até entrar em órgãos público, lojas, bares e restaurantes. É também o caso  de lembrar que as calçadas são para pedestres e não “terraces” de bar ou restaurantes, como previsto num decreto feito para os ambulantes. A esse respeito o Ministério Público já opinou como podemos ler as recomendações feitas e aqui publicadas a quase dez anos.: https://civviva-cidadevelha-cidadeviva.blogspot.com/2016/02/as-calcadas-segundo-o-mpe.html. ...e nada aconteceu, tanto que nas calçadas mais largas, encontramos até “currais” para clientes de restaurantes. A maior parte delas, que não superam nem 50 cm de largura, ainda são  ocupadas por postes.

O número de pessoas de idade que moram na Cidade Velha deve  ser lembrado no PD, pois até as lojas, bares e restaurante devem ter presente a necessidade de respeitar as normas relativas a acessibilidade... a menos que seja um problema criado pelo funcionário que examina os projetos e acaba autorizando, e não aplicando as leis em vigor. Não existem sanções para esses abusos?

Esse problema da autorização não seguir o que as leis exigem, ou o que recomenda o Ministério Público, ocorre também quando se fala de poluição sonora. A Policia Militar se lamenta quando faz vistorias nos locais noturnos, pois as autorizações são cheias de lacunas, não permitindo, muitas vezes, a aplicação das várias sanções provocadas por tais fatos.

Acontece o mesmo quando pedimos socorro à Policia Militar por questões de poluição sonora, e não vemos  tantos resultados, imediatamente... nem por parte do MPPA. Será que somente nós notamos o descumprimento do artigo 1.277 do Código Civil Brasileiro, que estabelece que "O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha."

"Parágrafo único. Proíbem-se as interferências considerando-se a natureza da utilização, a localização do prédio, atendidas as normas que distribuem as edificações em zonas, e os limites ordinários de tolerância dos moradores da vizinhança."?

A esse respeito o Código de Posturas de Belém estabelece as providências necessárias nos artigos: 63, 79, 80 e 81; especificando uma distância superior a 200m de hospital, igreja, escola, asilo, presidio e capela mortuária, de qualquer tipo de diversão pública, e durante as 24 horas do dia; a fim de garantir a tranquilidade da população. Para quem são dadas essas especificações?

Por outro lado, o CONAMA em sua resolução n°001/1990 estabelece os decibéis considerados prejudiciais à saúde e ao sossego público baseados na NBR 10.152 da ABNT. Outro documento ignorado, o ano inteiro por todos os órgãos que cuidam da luta contra a poluição sonora.

Esses não são todos os problemas da Cidade Velha, mas somente alguns entre os que, com certeza  o Plano Diretor poderia resolver. Ultimo exemplo a passagem de carretas e outros veículos enormes e muito pesados pelas ruas das áreas tombadas. A trepidação provocada não tem hora para acontecer. Assim, uma proibição a respeito, nas áreas tombadas, poderia ser bem-vinda. Os proprietários ou herdeiros nessa área tombada não tem nenhum retorno, depois que a trepidação causou danos.

Com todas essas reclamações, como é que ninguém é  chamado para discutir a realidade da cidade, em todas as suas especificidades,  no momento de refazer o PD? Ou será que, mesmo sem os necessários debates com a cidadania, os problemas acima citados estão sendo resolvidos? Não adianta dizer que já tem lei a respeito, pois são ignoradas mesmo depois que o IPHAN tombou mais um pedacinho de Belém.

O plano diretor tem tudo a ver com a  qualidade de vida dos cidadãos. Será que nenhum dos problemas acima citados entram no rol de interesse da planificação da cidade ou o PD deve somente garantir o máximo aproveitamento do espaço disponível na cidade.!!!


quinta-feira, 24 de julho de 2025

FALA UM LIDER E EDUCADOR INDIGENA

Por João Guató 

A PRIMEIRA PRISÃO DE BOLSONARO

Foi neste 18 de julho, um dia comum no calendário das nações, que o Brasil discretamente marcou sua história com a cerimônia silenciosa de uma tornozeleira eletrônica. O ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, o homem do grito sem verbo, da pátria sem livro, do governo sem ternura, acordou com o pé marcado — pela primeira vez, preso.

Não houve camburão. Não houve algema. Mas houve o que importa: a ferida no tornozelo da impunidade.

O gesto não é simbólico, é histórico. A tornozeleira, para além de metal e rastreamento, é a confissão pública de que até os intocáveis podem ser tocados. Pela primeira vez desde que deixou o Planalto — e talvez desde que entrou na vida pública — Bolsonaro foi oficialmente detido. Não com estardalhaço, mas com a discrição dos fatos irrevogáveis.

Durante anos, o país assistiu a um presidente que zombou da dor, que gargalhou de caixões, que flertou com o vírus e fez da morte política uma forma de gestão pública. Um homem que governou por negação: negou a ciência, negou a democracia, negou a história e, por fim, negou até o próprio passado, como quem tenta apagar pegadas no barro molhado da memória nacional.

Não foi apenas um presidente — foi um estado de espírito. Um mal-estar em carne viva. E por isso sua primeira prisão é também a nossa primeira respiração em muito tempo.

Dizem que a democracia é o regime das instituições. Mas ela também é o regime dos gestos. E o gesto de hoje é um sussurro que grita: o tempo da irresponsabilidade talvez esteja no fim.

Não é pouco. Há algo de reparador — e quase poético — em ver o homem que quis trancar o Brasil dentro de um delírio agora confinado em horários e zonas geográficas. Um toque de recolher imposto ao apóstolo da desordem.

A tornozeleira em Bolsonaro não é um adorno jurídico. É a primeira prisão — ainda que o corpo esteja solto, o símbolo está capturado.

Porque o que se prende, neste gesto, é o mito. É o artifício de um homem que se vendeu como “salvador”, enquanto salvava apenas os próprios filhos, aliados e fantasmas.

Bolsonaro não foi um erro isolado. Foi a febre que revelou a infecção. E hoje, ao vestir o sinal de que está sob vigilância, o Brasil sussurra para si mesmo que talvez, só talvez, comece a sarar.

Claro, há quem ache que tornozeleiras são mimos, que sem cela não há punição. Mas esse raciocínio esquece que o autoritarismo se alimenta do mito da invulnerabilidade. E quando o mito é tangido por ordens judiciais, monitorado por GPS, obrigado a estar onde não quer — o mito racha.

Hoje, Bolsonaro foi preso. Não como desejariam seus adversários mais febris. Mas do modo que mais o fere: em silêncio, sem manchete, sem glória. Apenas com a crueza burocrática dos autos.

A elite brasileira que pariu Bolsonaro não o fez por engano, mas por cálculo. Bancos, agronegócio, construtoras, corporações de fachada liberal — todos colheram os frutos amargos plantados com sementes públicas: isenções, desonerações, perdões fiscais, crédito subsidiado e blindagem institucional. 

O discurso era o do Estado mínimo, mas o saque foi máximo. Sob o falso manto do "livre mercado", multiplicaram-se lucros enquanto se estiolavam as políticas sociais, o SUS era vilipendiado, a ciência desidratada e a educação entregue aos falsos profetas do empreendedorismo de palco. A elite lucrou, sim, mas com a alma penhorada — se é que ainda a possui.


..... João Guató é líder e educador indígena


terça-feira, 15 de julho de 2025

1 - QUE FIM LEVOU O PLANO DIRETOR?

 

Há anos que o Plano Diretor já  deveria ter sido atualizado, segundo o que prevê a legislação em vigor. Um dia, porém, reclamei para uma arquiteta esse fato, e me respondeu que essa data era “pro forma”...

 Será? Sabe-se lá o que a motivou dizer isso, pois parece razoavelmente racional ter a expectativa de que as leis devam ser cumpridas, para o bem da sociedade.

Nota-se que muita gente em Belém, não gosta da existência de leis. Nem precisa se esforçar muito para constatar esse fato: elas, além de serem ignoradas, raramente são respeitadas e esse é um caso bem evidente.

Numa reunião na OAB sobre o patrimônio histórico, reclamei das casas com fachadas coloridas na  Cidade Velha, autorizadas pelas instituições públicas encarregadas do assunto. Uma outra arquiteta me respondeu: não tem nenhuma lei que proíba isso...e eu respondi: mas as leis em vigor falam de salvaguarda e proteção da nossa memória histórica, e só isso já bastaria para evitar essas descaractetizações ... Ela,  furiosa me responde: mas eu sou Master... Sabe lá o que queria demonstrar com essa afirmação...mas já fica claro que não entendia o sentido das palavras usadas na lei.

Ademais, além das leis, sempre é bem-vindo o bom senso a guiar as decisões.

Em 2018 ou 2019, participei de uma reunião, sem ser convidada, na ex-sede da Alfândega, com alguns arquitetos (menos de dez), dos quais a maioria eram mulheres. O motivo era o PD. De repente, uma delas pediu para falar da Cidade Velha, e eu, imediatamente, intervi e sugeri que talvez fosse melhor que eu falasse desse argumento primeiro, pois além de ser moradora da área, era também presidente da CIVVIVA, a associação de moradores declarada de Pública Utilidade, por defender o patrimônio desse bairro...

Achei que me deram a palavra com má vontade, mesmo se várias leis sugerem a ”a gestão democrática por meio da participação da população na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos  de desenvolvimento urbano” (Estatuto da Cidade, lei federal 10.257/71, art. 2 inciso II), ou o “estímulo à participação da comunidade através de suas organizações representativas” (Lei Orgânica do Município 30.03.1990, art. 108, inciso II)..., e assim por diante.

Nesse momento, porém, aproveitaram para me sugerir falar sobre os produtos que eram vendidos pelos “amigos comerciantes que tanto defendes”. Descobri então que, na verdade, esse era realmente um argumento desconhecido: praticamente ninguém sabia, que ali eram comercializados produtos necessários aos ribeirinhos, desde a areia para construção civil de casas, até equipamentos para uso nas atividades agrícolas. Era desconhecida a existência do comércio varejista de embarcações e outros veículos recreativos, além de peças e acessórios para motores de vários tipos, até para os po-po-pós, etc. naquela orla da cidade.

Levando em consideração que o Plano Diretor deve definir como a cidade será organizada, e como as pessoas e atividades serão distribuídas no território, nunca iria imaginar que, quem se propõe a renovar esse Plano não conhecesse o que vendiam os “meus amigos” comerciantes da Cidade Velha. 

Me surpreendi também que dessa reunião não participava ninguém formado em Direito e,  além de mim, não convidada, não tinha também qualquer outro representante da cidadania, ou de setores da economia local, apesar das leis em vigor sugerirem essas presenças. Logo em seguida chegou a Pandemia, e nunca mais ouvi falar do Plano Diretor. 

Duvidamos que o Direito seja disciplina estudada com o devido foco nas  faculdades de Arquitetura. Talvez por isso, vemos o aparente descaso ao fiel cumprimento da legislação, da parte de alguns profissionais, o que é demais para ser aceitável.

O saudável debate com a cidadania poderia servir para preencher essa lacuna e aproximá-los da realidade específica dos bairros, algo muito necessário para uma boa programação. A pretensão de saber tudo e não precisar de ajuda, de debate, de confronto, já demonstra ... o total desconhecimento ou um conhecimento insuficiente, o que acaba impedindo a aplicação das normas em vigor numa democracia.  

CADÊ AS AUDIÊNCIAS PÚBLICAS... que em caso de programação urbana, deveriam ser muitas.

Como falar de Democracia se todos ignoram as normas... independentemente do partido que representam.

quinta-feira, 3 de julho de 2025

PATRIMÔNIO, CULTURA E ...GENTRIFICAÇÃO

          Que bom saber que não somos os únicos a lutar contra a gentrificação..., palavra essa bem nova para alguns ouvidos.

Nós, como Associação de Moradores da Cidade Velha, acanhadamente, começamos a querer que isso não acontecesse no nosso bairro, mesmo antes que o IPHAN tombasse aquela área, em 2012; o que  aconteceu depois que o arq. Paulo Chaves já a tinha embelezado, mudando assim a nossa memória histórica.

Relativamente a área urbana, na internet temos esta definição: “A gentrificação é um processo de transformação de áreas urbanas, geralmente bairros antes considerados menos valorizados, que passam por revitalização e atraem moradores de maior poder aquisitivo. Isso leva ao aumento do custo de vida e, muitas vezes, à expulsão dos moradores originais"

Mais adiante acrescentam: “A gentrificação é um processo socioespacial caracterizado pela valorizção acentuada de uma área urbana. Esse fenômeno contribui diretamente para o aumento da desigualdade.”

Após o tombamento pelo IPHAN aumentou a nossa luta em defesa do que sobrou da nossa memória histórica. As nossas leis falavam de salvaguarda, defesa, proteção; e isso deveria acontecer através de “ações cruciais para a preservação da identidade cultural e memória de um povo”. Deveria  envolver “medidas para garantir a permanência e viabilidade do patrimônio, incluindo sua identificação, documentação, proteção, promoção e valorização”.

Mesmo com tudo aquilo que se lia a respeito, começamos a ver o “colorização” de casas na área tombada. Como não existia uma lei específica disciplinando o uso das cores de fachadas das casas na área tombada, ignoraram o que as palavras “salvaguarda, defesa e proteção” queriam dizer e começaram a revestir as fachadas com cores até então nunca usadas, que descaracterizaram as edificações das casas da área tombada.

Não somente ignoravam as leis e o sentido das palavras, mas até a gestão  participativa no processo de salvaguarda foi evitada. Aliás, não foram adequadamente divulgados os Planos de Salvaguarda que deveriam integrar o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial (PNPI). Assim, até as calçadas de liós, tem sido indevidamente substituídas em calçadas de edificações ocupadas por órgãos públicos, com toda tranquilidade (e impunidade...)

Esse comportamento não pára na defesa do patrimônio histórico. Vemos agora, esse “fenômeno silencioso”, paralelamente,  se expandir em direção da  cultura popular. Eis aqui uma explicação que nos dá Marcelo Bastos no Facebook:

A CULTURA ENLATADA E O BOI DE VITRINE: O CASO DO PAVULAGEM E A GENTRIFICAÇÃO SIMBOLICA DE BELÉM.

 
Nos últimos anos, a cidade de Belém tem assistido a um fenômeno silencioso, porém brutal: a transformação da cultura popular em produto turístico domesticado. O Arraial do Pavulagem, outrora expressão viva do povo, virou vitrine para patrocínio, palanque eleitoral e selfie de influencer. E isso não é acaso. Trata-se da velha lógica do capital engolindo o simbólico e cuspindo enfeites de plástico. Pierre Bourdieu já nos alertava: a cultura, quando perde sua autonomia e se submete aos mecanismos de distinção e mercado, deixa de ser campo de resistência para virar espaço de consagração simbólica das elites (BOURDIEU, 1983).

Não se trata aqui de negar a importância do Arraial ou sua história. Pelo contrário. Ele nasceu das ruas, da juventude, do enfrentamento à caretice cultural e ao apagamento das tradições amazônicas. Mas o que se vê hoje é um espetáculo padronizado, embalado para exportação, com roteiro aprovado por edital. O povo continua lá, mas na borda. No centro do cortejo, está a indústria do entretenimento, não mais a expressão autêntica do brincar de boi. Como dizia Adorno, "a indústria cultural não produz arte, mas mercadoria estética para o consumo conformista" (ADORNO & HORKHEIMER, 1944).

Essa gentrificação cultural — onde práticas comunitárias são apropriadas, esvaziadas de conflito e revendidas como experiência — não é exclusiva de Belém. Mas aqui ganha contornos graves. Porque se vende como "resgate da tradição", quando na verdade mascara a exclusão. Os ribeirinhos, os negros, os trabalhadores da periferia, os mestres da cultura popular continuam sem palco, sem patrocínio e sem voz. Enquanto isso, DJs, designers de som e socialites culturais dividem a cena no Arraial gourmetizado da Cidade Velha.

A crítica não é moralista. Não se trata de dizer que cultura deve ser pura, ou que tradição não possa dialogar com o novo. Trata-se de reconhecer que há uma luta de classes simbólica em curso. Quando se retira o boi do bairro e se instala num palco cercado de tapumes com patrocinador estatal, o que se tem não é difusão cultural, é domesticação. É a conversão do sagrado em estética de evento. É a morte lenta da cultura viva.

A Escola de Frankfurt nos ensinou que a cultura de massa serve, sobretudo, para anestesiar. Ela transforma o diferente em familiar e o insubmisso em decoração. O Pavulagem, enquanto cortejo de rua, era espaço de tensão, improviso e invenção popular. Hoje, é peça de calendário oficial. Cabe na agenda do prefeito, no feed da influencer e no edital do banco estatal. Mas não cabe mais no coração do povo que dançava sem crachá, sem permissão e sem drone.

É curioso que, ao mesmo tempo em que o Arraial cresce como fenômeno midiático, outros folguedos somem. Cadê os cordões de pássaros? Cadê os bois de matriz quilombola? Cadê os mestres anônimos das margens dos igarapés? Silenciados. Porque não se enquadram na lógica do espetáculo. Porque não têm figurino Instagramável. Porque não servem à nova elite progressista que governa a cultura com sorriso de marketing e lógica de mercado.

Estamos vivendo um tempo em que a estética substitui a ética, e o aplauso substitui o pertencimento. Não basta que a cultura esteja presente — é preciso perguntar: de quem é? Quem a controla? Quem lucra? A gentrificação simbólica é isso: a ocupação dos espaços culturais populares por agentes hegemônicos, sob a retórica da valorização, mas com a prática da apropriação. E isso precisa ser denunciado.

Não se trata de atacar pessoas. O problema não é quem dança o boi com tênis importado. O problema é que o boi virou vitrine, não rito. Virou produto, não processo. A festa do povo virou foto de campanha. A cultura de rua virou contrato. Isso não é tradição. É pastiche. É espetáculo sob controle. É simulacro de um povo que ainda resiste, mas está sendo expulso da própria festa.

Resistir à gentrificação cultural é, hoje, um ato político. É defender que o boi volte para os becos. Que a música saia do palco e volte para os quintais. Que a tradição se reconecte com a vida real, não com o cronograma do marketing institucional. Como diria Adorno, a arte verdadeira é aquela que incomoda, que rompe, que nos tira do lugar comum. E talvez o nosso Pavulagem precise voltar a incomodar, antes que seja tarde
.


sábado, 28 de junho de 2025

2 -TOMBAMENTO , ABANDONO...

 ... E A COP30.

Nem como CIVVIVA, nem como cidadãos, fomos chamados para discutir o que fazer na Cidade Velha, como prevê o ESTATUTO DA CIDADE relativamente a participação da população e associações representantes dos vários segmentos da sociedade na formulação, execução e acompanhamento de planos e projetos de desenvolvimento urbano, a ser feito, neste periodo de tempo,  com o dinheiro destinado a COP30.

- O canal da Tamandaré divide  o bairro em:  area tombada e aquela... abandonada.  Aliás, com todas essas chuvas que tivemos, não sabemos se  com as proximas, vai continuar alagando ou não essa area de "recuperação" e amodernamento do canal.  Não tivemos noticias se algo  mais seria feito na Cidade Velha -tombada ou não -, em ambos os lados desse canal.

- As calçadas, tão necessárias aos pedestres, não tiveram nenhuma atenção como seria necessário.  Somente as que circundam a ALEPA, de onde desapareceram as pedras de liós, tombadas pela SECULT e, depois substituidas com uma pedra brilhosa tipo marmore.

 - A poluição sonora e a passagem de carretas, que juntas, provocam trepidação e consequentemente danos ao patrimônio, continuam sendo autorizadas apesar do que sugerem as leis, inclusive sobre os decibeis.

- Assaltos  e furtos, aumentam sem alguma vigilância particular em todo o bairro.

- Sem esquecer o abandono cruel das praças: do Relógio, ocupada por quem usa crack, e a D.Pedro, em frente a orgãos de governo municipal e estadual, onde se instalou um acampamento "ao Deus dará".

De um dia para o outro, porém, sem notar particulares movimentos na Ladeira do Castelo, a encontramos toda pintadinha de novo. Será algo so "para inglês ver" ou aqueles prédios foram restaurados internamente? Seus proprietários, a Arquidiocese,  ja sabe como vai usa-los?











Será que essa providência é merito da igreja?

Quanto a praça do Açai, não demonstra ter tido particulares atenções... além dos balizadores, iguais aqueles roubados das quatro praças recuperadas com dinheiro do PAC das Cidades Históricas em 2020. Quem sabe se chegarão intactos ao mes de novembro? Não vimos ninguem "tomando conta", nem da praça da Sé nem da... Ladeira.



Ver, subir e descer a Ladeira do Castelo, dá um enorme prazer para o cidadão, agora que está limpa. A cura do patrimonio nos faz entender que alguem se interessa e que aquilo tem valor. Pena que não sucede sempre e que ignorar os cidadãos não dá bons resultados, ou seja, o confronto com a cidadania ajudaria a ter melhores resultados.

Será que teremos outras surpresas, ou continuaremos ignorados, como as leis? 

TOMARA QUE PIXADORES NÃO COMECEM A ESTRAGAR ESSE RESTAURO. NÃO VI NENHUM GUARDA MUNICIPAL NO ENTORNO.


FOTOS DE ADVALDO  LIMA